Incapaz
Voltando um pouco atrás.
Eu sempre fiz as coisas por mim, mesmo contrafeita fazia sozinha.
Fazia as coisas sozinha mas contrafeita porque sabia bem que houvesse alguém que as fizesse por mim.
Como a princesa que gostava de ser salva pelo príncipe encantado.
Recuando até um pouco mais, a minha avó sempre me chamou de freira.
E olhando bem, os meus pais faziam tudo por mim.
Cozinhavam, limpavam, faziam-me alguns trabalhos de casa (lembro-me do meu pai fazer uma rosa dos ventos), quando eu estava doente falavam por mim.
Sempre que havia algo mais difícil eles faziam por mim.
Sempre que havia alguma dificuldade eles estavam lá.
Eu nem precisava dizer nada.
Eu acho que chegou a um ponto em que eles assumiam que eu não conseguia.
Ou não conseguia à maneira deles.
Ou não conseguia na rapidez deles.
Na altura sabia-me bem, agora sinto-me uma incapaz.
Sinto-me uma incapaz.
Ainda hoje, a tratar do meu bebé, mesmo fazendo sinto que preciso de ajuda do meu companheiro.
Ou sinto que o meu companheiro não percebe nada e tenho de telefonar aos meus pais a perguntar a opinião.
Sempre que tenho uma dificuldade o meu primeiro pensamento é: "tenho de ligar aos meus pais".
Já é uma coisa inconsciente porque quando vou a ver já estou a pensar neles.
Mas como estava a dizer, ainda hoje, a tratar do bebé, faço, faço as coisas, faço o que tenho a fazer, mas sinto que não está bem, que não é suficiente, que é tudo atabalhoado, tudo atrapalhado.
Tenho três pensamentos/trabalhos simultâneos enquanto faço uma tarefa:
Penso que não estou a fazer nada;
Penso que estou a fazer tudo mal;
Penso que devia ligar aos meus pais.
Eles ajudam e eu sinto-me ainda pior, sinto-me ainda mais incapaz.
Atestado de incompetência. PUMBA!
E eu sei que eles não fazem por mal, eles ajudam porque gostam, porque lhes sabe bem.
Mas também sei que gostam do reconhecimento (quem não gosta?), sei que gostam que fique na obrigação.
Como se eles se alimentassem disso.
Eles ajudam, eu sinto que preciso de ajuda (mesmo que não precise realmente), eles ajudam ainda mais, eu sinto-me na obrigação, eles sentem que me têm sempre na mão, ou me têm por perto.
Tenho que me desenvencilhar disto.
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